MANDOS, COMANDOS E DESMANDOS LEVAM O SISTEMA PENITENCIÁRIO MATOGROSSESE AO RETROCESSO

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Iniciamos 2019 com um novo governo, que durante a campanha já demonstrava seu (des) conhecimento sobre o Sistema Penitenciário: Arthur Nogueira questionou a Mauro Mendes sobre sua solução para o sistema penitenciário. Mauro respondeu que quer criar um programa chamado ‘Tolerância Zero’, com investimento na polícia, capacitação de profissionais, e mais armamento para os policiais. “Precisamos exigir do governo federal que possa fazer melhor controle das fronteiras, entregar as forças de segurança pra fazer uma repressão ao crime e tráfico de drogas no estado”, afirmou.

Nogueira lembrou-se da época em que Mauro foi prefeito, e cobrou: “Você como prefeito tinha obrigação de cobrar do estado e da União”. Segundo ele, é preciso investir em tecnologia, construir presídios com celas individuais, além de investir em trabalho e estudo para os reeducandos, e valorização dos servidores do sistema penitenciário.

Na tréplica, Mauro afirmou que, como prefeito, apoiou as forças de segurança, e também o projeto de que os policiais trabalhassem, em seu horário de folga, para a prefeitura. Também lembrou que comprou mais dez viaturas. “Cada um tem sua responsabilidade. Cuidei das minhas obrigações, talvez por isso tenhamos saído com mais de 80% de aprovação, porque cumprimos a nossa obrigação”. (trecho do debate da TV Vila Real, entre os candidatos ao governo de MT e foi ao ar em 30/08/2018).

Por isso não foi surpresa quando a Lei Complementar Nº 612, de 28/01/19, em seu artigo 35, extinguiu a Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos do Estado de Mato Grosso, SEJUDH/MT, e incorporou o Sistema Penitenciário à Secretaria de Estado de Segurança Pública/SESP, sendo que aos servidores penitenciários couberam vários questionamentos, que até respectiva data não tem resposta plausível: Qual estudo de caso foi feito para fazer a incorporação? Esse formato trará benefício a quem? Era necessária tal incorporação ou foi um mero capricho? Porque lendo as respostas no trecho acima e a ação de incorporação, com menos de 30 (trinta) dias de mandato, só constata o grande retrocesso do Sistema Penitenciário mato-grossense, que há muito vinha se destacando no ranking entre os estados brasileiros, como um dos bons exemplos pela prestação de serviços e por ter os servidores penitenciários, exclusivamente, da carreira do Sistema Penitenciário.

Os problemas com superlotação e déficit de efetivo, ambos na maioria das unidades penitenciárias, que deságuam em sobrecarga e má qualidade de vida aos servidores penitenciários, sendo esse papel muito grande e muito pesado. Pressupõe-se, a partir das legislações vigentes, que a prisão ressocializa, reeduca e reconstitui a vida do sujeito e que quem deverá fazer esse papel são os servidores da unidade, particularmente, os agentes penitenciários, que têm um contato maior com o (a) recluso (a).

Então, se espera que eles, além de ser agente penitenciário, sejam também agentes reeducadores, reintegradores e ressocializadores, com baixa motivação e valorização. Mesmo ouvindo os comentários, do então candidato ao governo do estado, isso não esmoreceu as expectativas dos profissionais penitenciários, porque esperavam ter reconhecimento no trabalho desenvolvido pelos servidores penitenciários, até a publicação do Decreto Nº 226, de 21/08/19, que dispõe sobre a estrutura organizacional da Secretaria de Estado de Segurança Pública – SESP, a redistribuição de cargos em comissão e funções de confiança. Esse decreto só valida o retrocesso de 15 (quinze) anos, ao qual joga os servidores penitenciários e em detrimento ao avanço do crime organizado, que vem recheado de mandos, comandos e desmandos.  

Atualmente, o estado conta com muitos especialistas, que bradam conhecer o Sistema Penitenciário, por meio de livros, artigos, resenhas, laudas, perguntas direcionadas, por entrar como visitante, em atendimento eventual e conversas de bastidores, como denúncias infundadas que expõem irresponsavelmente todo trabalho sério que está sendo desenvolvido pelos profissionais do sistema penitenciário.

Não é culpa dos servidores penitenciários se os órgãos da execução penal não estão observando suas atribuições: Juiz da Execução Penal ou da Sentença (VII – inspecionar, mensalmente, os estabelecimentos penais, tomando providências para o adequado funcionamento e promovendo, quando for o caso, a apuração de responsabilidade); Ministério Público (Parágrafo único. O órgão do Ministério Público visitará, mensalmente, os estabelecimentos penais, registrando a sua presença em livro próprio); Conselho Penitenciário (II – inspecionar os estabelecimentos e serviços penais); Conselho da Comunidade (I – visitar, pelo menos mensalmente, os estabelecimentos penais existentes na Comarca); e Defensoria Pública (Parágrafo único. O órgão da Defensoria Pública visitará periodicamente os estabelecimentos penais, registrando a sua presença em livro próprio), por esse motivo acatam as denúncias, mas não percebem a instabilidade que isso causa aos servidores, e colocam dúvida ao que estão fazendo sendo isso desgastante, mas necessário. Poderíamos ter mais tranquilidade em diminuir as denúncias, se essas inspeções e visitas fossem realizadas com mais frequência.  

Em meio a tantas turbulências, o secretário de estado de segurança pública responde com uma operação, que tem demonstrado o grande potencial dos servidores penitenciários, mas outras ações complementares precisam de comando e a mensagem que passa é de que o secretário de estado está “A Espera de um Milagre”… Infelizmente, o crime organizado não espera e a cada dia encontram uma forma espetaculosa de driblar as regras formais.  

Governador, precisamos de equipamentos, capacitação, valorização e, principalmente, de diálogo, somos cidadãos e servidores honrados e por muitas vezes, tiramos o alimento da boca da família para adquirir algo e poder salvar vidas. Não condiz com a verdade, a afirmação de que o Estado está ausente no comando das ações dentro das unidades, pois há uma série de desmandos para acatar que se tornam processos ou ameaças ou arbitrariedades, caso não sejam cumpridos. O que fará a diferença em sua gestão, senhor governador, é dialogar e ouvir quem deseja colaborar com sua administração, ou ela será mais do mesmo.

O sistema penitenciário necessita de gestores que o conheça, tenham práxis comprovada e saibam tomar decisões sensatas, que não traga riscos ou prejuízo à clientela, servidores e visitantes. Não aceitamos o retrocesso que estão impondo aos profissionais penitenciários e estaremos na resistência, mas na expectativa de dias melhores para o Sistema Penitenciário do Estado de Mato Grosso.    

*Jacira Maria da Costa Silva é Agente Penitenciária, desde 2004, atualmente, Presidente, em substituição, no Sindicato dos Servidores Penitenciários do Estado de Mato Grosso, Secretária Geral na Federação Nacional dos Servidores Penitenciários e Especialista em Gestão Penitenciária.